MUDAR DE CASA*
Despedimo-nos da casa que foi só nossa durante vinte e dois anos.
Invadida pela emoção do apego por este meu lugar, sentei-me no chão e agradeci por tudo o que vivi ali.
Enquanto observava as paredes, agora nuas, apenas enfeitadas com as marcas das molduras, despidas de todos os desenhos dos miúdos e de mais de duas décadas de fotografias, pensei no quanto criei para mim e para todos ao longo destes anos.
Os últimos dias foram passados a arrumar as e mil e uma recordações guardadas nas gavetas, armários, em caixas e caixinhas. Horas a fio a destralhar e a escolher o que seguia connosco dentro de caixotes de papelão até ao próximo lugar.
A promessa dita várias vezes em voz alta…não vais comprar nem mais um alfinete minha cara.
As lembranças, essas, seguem dentro do peito.
As maratonas de estudo depois de decidir regressar aos bancos da faculdade, os três testes de gravidez positivos na bancada da casa de banho, com um intervalo de apenas dezoito meses. As corridas para a maternidade depois de as águas rebentarem e a primeira noite em casa a embalar o bebé, enamorada pelo cheirinho de cada um. Os primeiros passos desengonçados casa afora e a entrada para a escola.
E aquele aconchego que sente ao chegar ao lugar a que chamamos casa, depois de um dia cinzentão.
Antes de fechar a porta os miúdos quiseram dar beijinhos nas paredes e dizer um adeus que ecoou pela casa vazia.
Já no carro fui invadida pelo nervoso miudinho, pelas tais borboletas na barriga, de quem teve a coragem de arriscar, de ser feliz.