DIÁRIO DE UM ESQUECIMENTO

Tudo começou por pequenos esquecimentos, episódios aparentemente banais como os óculos e o telemóvel perdidos em parte incerta. Depois tornou-se habitual descobrir as tuas chaves e outros objectos pessoais nos sítios mais improváveis. Aos poucos e poucos questionavas de onde conhecias esta e aquela pessoa, assim como alguns lugares deixaram de ter qualquer significado para ti.

E apesar do teu pai , ter ficado aprisionado numa vida sem memória na qual as pessoas que amava não faziam parte dela, decidimos não ficar presos a medos ou a receios do que poderia ou não vir a acontecer, deixámos a vida tomar o seu rumo, porque estava tudo certo.

Mas as tuas boleias tornaram-se em momentos de angústia e ansiedade a partir do dia que percorremos lado a lado a cidade à procura do teu carro. O tempo foi passando, mas o teu sentimento paternal não, pois continuavas a insistir que podias levar-me ali e aqui. O meu não disfarçado de desculpas deixava-te de olhos postos no chão ficando no ar um sentimento de perda, de dever não cumprido, e isso destroçava-me.

Sem demoras procurámos ajuda, era o momento de juntos enfrentarmos os tais medos e receios…desse dia guardo apenas uma imagem, a de entrares de mão dada com a mãe no consultório do neurologista.

Está tudo certo.

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